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4/26/2017

Quando uma montanha de lixo te ensina sobre beleza

 Hoje enquanto estudava para responder um questionário da faculdade me deparei com uma reflexão interessante, era sobre passado e futuro, em seus estudos, o autor em questão, fala sobre como tanto o passado quanto o futuro só existem realmente enquanto presente, o primeiro  por que já deixou de ser, e só pode ser lembrado, o segundo por ainda poder ser, e que só vira a ser verdadeiramente quando for presente. Não vou me esforçar para te explicar tal ideia, talvez nem eu tenha entendido  completamente o que li, porém tal texto trouxe uma mudança nas minhas interpretações sobre "tempo" e espero que essa breve introdução possa fazer você passar por algo similar, caso não, sinto muito. Por mais que eu goste dos meus textos, duvido muito que um sobre uma montanha de lixo possa trazer questionamentos pertinentes para você, então leia por conta e risco.




 Tudo começou como uma piada interna entre funcionários do mesmo setor, algo que creio ser comum em qualquer função, de qualquer tipo de local de trabalho, aquelas piadas que você nunca entende quando acontece no bar, aquelas que só quem trabalha junto vai entender, aquele produto que todo mundo compra "errado", fulano que faz "x" assim e não assado, enfim, no caso em específico a piada era sobre um amontoado de lixo, esquecido a merce da chuva e do tempo à décadas, realmente não precisa de muito para entreter gente idiota por natureza.

 As piadas giravam em torno de qualquer assunto possível sobre um amontado de material abandonado, passeava entre formas de vida misteriosas vivendo ali, até  possíveis possibilidades de algum dia certos funcionários,  do futuro claro, viessem a limpar aquele lugar, era tanta suposição por segundo que cogitamos para os futuros escolhidos um ataque, de alguma entidade milenar que residia ali e claramente estaria puta da vida ao ser perturbada por meros mortais, uma pena que os escolhidos não eram funcionários futuros, e também que ninguém foi atacado, uma pena.

 As primeiras perguntas dirigidas a nós, os escolhidos do passado, que no caso estavam no presente OI?, não eram claras, muito menos sinceras, beiravam uma ardilosidade sublime, começou com algo assim: "imagina limpar isso aqui galera, que trabalho né? Quantos dias vocês acham que poderia demorar isso? Teria que ter o equipamento correto né gente? ", quando percebemos tais perguntas já tinham se tornado  nossa realidade, lá estávamos nós, meu amigo de setor, que pediu para ser chamado de "mago supremo do papelão" por nenhum motivo aparente, tirando uma nostalgia pouco justificada, e eu.

 Estávamos olhando para aquela pilha de lixo,  um olhar já abatido no rosto de ambos, daquele tipo que sabe, lá no fundo, que não teria ajuda naquela missão, nenhum dos dois tinha se aproximado daquela área antes com intenções de limpeza, na verdade, eu sequer tinha me dirigido aquele amontoado de produtos esquecidos uma única vez até então, aceitamos nosso fardo, porém antes de começar ouve uma breve discussão sobre por onde começar, o resultado foi uma breve e triste resposta do "mago supremo do papelão", ele disse com pesar tanto nos olhos quanto na voz:

 "Não faz diferença por onde começar se você vai ter que terminar."

  Assim iniciamos nossa investida com intenções de limpeza que, de forma alguma alguém presente ali estava preparado para executar, começamos a sentir nojo de estar perto de nós mesmo por tanto tempo, principalmente naquele estado de sujeira quase irreversível que nos atormentava, o cheiro era nauseante, papelão que tomou chuva por tanto tempo que parecia massinha de modelar podre, alguns seres vivos não ligavam muito para diferença de tamanho e davam voltas em nossos braços, durante algum tempo nem falávamos um com o outro, era para evitar possíveis dejetos em nossas linguás, durante o horário de almoço, eu gostaria de poder ter almoçado com outra pessoas que não fosse eu, um sentimento que mesmo após lavar a mão pela 10° vez eu ainda estava sujo demais para ingerir alimentos, aquilo estava me deixando realmente pensativo quanto aos níveis de sujeira que um ser humano pode ter contado sem ser afetado diretamente.

  Era uma pilha realmente volumosa, que ainda sim cedeu a persistência do assalariado brasileiro, porém isso não foi tão rápido assim, nos primeiros dias, por falta de preparo tanto psicológico quanto corporal, fomos lentos no executar da tarefa, depois, aliados de um foda-se muito maior que esse ai que você imaginou, alguns elásticos na calça para evitar seres enxeridos bisbilhotando por dentro de nossas vestes, e muita paciência, chegamos ao ponto de estar passando vassouras no chão, a pilha de lixo tinha se reduzido a poeira no chão, tinham se passado 4 dias.

 Enquanto as vassouras iam de um lado para o outro, eu perguntei ao mago como ele estava se sentindo após concluir aquela missão, ele me respondeu brevemente:

 - Me sinto sujo.

 - Mas cara fizemos algo incrível aqui essa semana - Eu realmente pensava isso.

 - Incrível vai ser o banho que vou tomar em casa.

 Por fim chamaram os responsáveis pelo mandato da limpeza, todos vieram, alguns que nem precisavam vir também apareceram, todos estavam com olhos incrédulos para tamanha diferença na paisagem do galpão, a pilha de lixo não estava mais ali, palmas e comentários passeavam pelo vento, risadas sobre como deveria ter sido difícil dividiam espaço com as palmas, por fim enquanto todos estavam indo embora voltando pára seus afazeres, um deles diz:

 - Gente lá dentro está uma loucura, pode deixar que alguém termina de limpar, vamos ajudar rapidinho beleza? Obrigado.

 Olhei para o mago, ele estava tão abatido quanto eu, o silêncio nos levaria de volta para nossos afazeres, apenas um comentário foi feito, como que o ultimo suspiro de um guerreiro prestes a morrer:

 - Pena que esses comentários positivos não limparam a sujeira sozinhos. - disse o mago.

 Olhamos mais uma vez para o local onde residia nosso inimigo, nosso fardo, nossa missão, e nada mais estava ali, apenas nosso trabalho, nossos esforços, nossas reclamações, mas isso ninguém quer ver, somos feitos de resultados não de pressupostos.


Sim esse texto chegou ao fim, espero que você tenha gostado, é óbvio que hoje no auge do pensamento capitalista eu entendo que faz, muito sentido, alguém pedir para você limpar e organizar produtos para futuras vendas, são seus funcionários, eles estão lá para isso, é que aqueles funcionários do passado, que não entendiam aquela situação como algo positivo, saíram daquela semana, dificultosa por sinal, transformados, evoluídos, calejados pela vida, ou seja, mais fodidos da cabeça, como deve ser em qualquer atividade remunerada que se preze, sendo assim até uma próxima.

Ass: M.O.P.


ps: Depois da primeira barata que passou pelo meu ante-braço eu já tinha desistido.
ps²: As Caixas de cima já estavam fedendo, agora imagine as de baixo, as que tomaram a chuva da chuva, aquele que escorre de cima para baixo, até a base, imagine cada camada pior que a outra.
ps³: Na semana seguinte ficamos conhecidos como lendas da limpeza.




 

Um comentário:

  1. KkkkkkkkkkkkkkkkkkkKkkkkkkkkkkkkkkkkkkKkkkkkkkkkkkkkkkkkk
    Sou um filósofo, e essas pessoas com comentários positivos são foda

    Ass:Mago Supremo do Papelão

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